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Conversa #38

Sleepless (Baran bo Odar, Estados Unidos, 2017)

Os condimentos deste thriller são no mínimo auspiciosos: bom elenco, excelente fotografia, locações oníricas (apesar de transcorrer mais em estúdio --- à exceção, claro, de quase todas as cenas de perseguição automotiva). Mas é a edição que revela o filme.

Frenética demais, ela parece querer disfarçar algo. O disfarce tem a ver com roteiro: fazer esquecer uma trama um tanto sovada: um traficante (Scoot McNairy) tem uma partida de cocaína a receber de um dono de casino (Delmot Mulroney). A negociação é interceptada por policiais (Jamie Foxx e T.I.) . Aparentemente esses policiais são inescrupulosos e pretendem ficar com a droga. Pelo menos, é o ponto de vista de uma colega que os monitora (Michelle Monaghan). Para piorar a situação, o filho de um dos policiais é sequestrado pelos traficantes. Os eventos se passam em tempo real. Se é que alguma coisa pode passar em tempo real numa edição dessas. Nesse frenesi de cortes e planos atropelando-se.

Todas os requisitos de "entretenimento" e de enfrentamento num thriller de ação dizem presente. Perseguições em carros. Tortura. Emboscadas. E sobretudo esse quebra pau e esses tiroteios em locais-chaves: piscinas, cozinhas, avitrinados, escritórios de executivos, mesas de apostas em casinos, estacionamentos e pistas de discoteca. Brigas que ferem pouco em meio a farináceos, cacos de vidro partido, água de piscina de suíte executiva e vãos de estacionamento onde se pode jogar uma partida de futebol contra os pilotis.

Sleepless é um protótipo. Devia ser estudado para se entender fórmulas. No caso, como produzir um thriller de ação em 2017 que vá bem na bilheteria e não naufrague totalmente com a crítica. O receituário está quase todo lá. Os dois policiais mais empenhados --- inteligentes, manhosos --- são negros. A policial honesta, a única que desconfia deles, é mulher --- branca, no entanto. O policial vilão, o traidor repugnante, é um "homem branco", straight e aparentemente cheio de "valores". Os outros homens brancos são um dono de casino inescrupuloso e um violento traficante de drogas. Até quando se acredita em contos de fadas como este são outros quinhentos. A fórmula começa a dar sinais de cansaço. Ou o ridículo que será no futuro entrever a luta de igual para igual entre Michelle Monaghan e o brutamontes Jamie Foxx.

Scoot McNairy está particularmente bem como chefão do tráfico. O mesmo se pode dizer dos policiais mocinhos: Jamie Foxx e Michelle Monaghan. A excepcional fotografia de Mihai Mălaimare Jr. --- o mesmo de The Master (Paul Thomas Anderson, 2012) --- talvez seja a mais injustiçada personagem em toda essa equação. (Há closes fantásticos. Naturezas mortas. Pena que passem batido nessa edição que antes cafungou uma carreira). Mas, como numa boa feijoada, nem sempre bons ingredientes garantem a degustação de um pitéu. Apesar das potencialidades, filme para não estar na prateleira.

E sim no Tela Quente daqui a dois anos.

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