Ela é outra
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Conversa #53 - Reclassificando Clássicos [12]
My Name is Julia Ross (Joseph H. Lewis, Estados Unidos, 1945 - cin. Burnett Guffey)
Tramas em que se tenta enlouquecer ou definhar alguém a partir de um artifício que faz com que todo o senso-comum da vítima desmorone não são infrequentes no universo noir. Eles situam-se a meio caminho entre o thriller psicológico e o filme de terror. A mais clássica dessas produções é, sem dúvida, Gaslight (George Cukor, 1944). My Name is Julia Ross é um tanto o primo pobre de Gaslight, em termos de produção e elenco. (Embora não se sinta tanto, pela perícia de Joseph H. Lewis e seu diretor de fotografia, Burnett Guffey. Eles souberam compensar os poucos recursos de que dispunham. E foram recompensados por tanto).
Durante a Segunda Guerra, Julia Ross (Nina Foch) é aceita como secretária por uma agência de empregos londrina. Ela terá de dormir na casa da nova patroa. Mas após a primeira noite e sem maiores explicações, acorda dois dias depois num vasto solar, em Cornwall. Mas do que isso, todos a tratam por outro nome e como se ela fosse casada. O marido não é mais que o mesmo psicótico de Psycho (1960), vivido não por Anthony Perkins mas pelo clássico vilão dos anos 1940: George Macready. Só que aqui ele, ao invés de um espantalho, ele é de carne e osso. Possui uma cicatriz em uma das faces. E uma mãe de verdade. E ao invés de esfaquear a mocinha no banho, destrói o estofado de um marquesão diante da mãe.
Pode parecer pueril que conceitos da psicanálise sejam traduzidos para o cinema com esse grau de clichê e caricatura. Mas estamos num momento de lua de mel entre ambos. E talvez isso fosse inevitável. Mesmo para um diretor com a independência de Joseph H. Lewis, contando com o auxílio luxuoso de Burnett Guffey. Lewis, meia-dúzia de filmes depois, voltará à carga em uma produção bem mais madura e complexa, desta feita fotografada por Russell Harlan: Gun Crazy (1950). De outro modo, Julia Ross, como resultado de condições modestas de produção, não deixa de ser uma declaração de independência. E de excelência do filme B.
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